OPINIÃO
Maternidade e corrida de rua

A maternidade e a corrida de rua são duas coisas que podem se complementar de maneira poderosa e podem se unir de maneiras inspiradoras e transformadoras. Enquanto a maternidade envolve cuidar, nutrir e amar um filho, a corrida de rua representa uma busca por superação, saúde e bem-estar pessoal.
A maternidade é uma jornada de mudanças físicas, emocionais e de estilo de vida. A chegada de um filho traz novas responsabilidades e ajustes na rotina diária. Para muitas mães, a corrida de rua se torna uma maneira de manter o equilíbrio e preservar a sua identidade pessoal, mesmo diante dos desafios da maternidade. A corrida oferece um tempo precioso para si mesmas, uma pausa do papel de mãe, um momento para focar em seus próprios objetivos e necessidades.
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Lembro quando meu filho caçula nasceu. Vivi a turbulência dos desafios de sua saúde fragilizada, após a luta pela sobrevivência pós-parto e o advento do diagnóstico de autismo, após alguns meses. Era tudo novo, inclusive ter 2 filhos em diferentes idades e não ter uma figura paterna ao meu lado. Eu precisava trabalhar para sustentar a casa. Ser mãe do meu filho mais velho, pré-adolescente, com sua agenda e necessidades. Eu vivia no meu limite financeiro, físico e emocional. Chorava no banho ou no meio da madrugada.
Meu reencontro comigo e com a corrida
Embora minha relação com a corrida tivesse começado em 2002, tive uma longa pausa entre a gestação e o nascimento do meu filho em 2008. Já somava pouco mais de 2 anos sem calçar um par de tênis e sair para correr. E foi, literalmente no esgotamento da minha alma, que abri meu armário e fugi pra rua. Aquele dia, corri sem rumo, sem me preocupar com velocidade ou distância ... eu só precisava, correr! E foi libertador!
Foi um momento de libertação emocional e mental. A corrida nos permite esse contato conosco, de encontrar clareza mental e de gerenciar o estresse. Correr pode ser uma forma de aliviar as tensões do dia a dia, proporcionando um momento de introspecção, paz e renovação.
Corredora atípica
A fisioterapeuta, Danielle Andreatta, 32 anos, tornou-se mãe de Júlia, aos 15 anos. “Nunca romantizei a maternidade. Não foi fácil, por mais que eu tivesse muito apoio. Eu jamais abandonei minha filha. Mas esse processo da maternidade, realmente foi muito difícil!” - desabafa e complementa: “Eu estava numa fase muito desregulada. Eu tinha muita sobrecarga de trabalho, sobrecarga de faculdade. Meu foco era nos estudos. E a minha filha tinha que se encaixar nesse contexto todo.” Dani, como gosta de ser chamada, foi recentemente diagnosticada dentro do espectro autista e somente após a clareza do que a tornava diferente das demais pessoas, conseguiu melhorar seu relacionamento consigo, com a família e com a filha, que atualmente, passa também pelo processo investigativo de TEA.
“Nesse meio termo entre a gente se descobrir e tentar se encaixar, eu e minha filha, brigamos muito. Foi muito difícil. Foi muito sofrido. Foi muito desgastante, tanto pra ela, quanto pra mim. “, e conclui, com um largo sorriso e uma expressão de felicidade: “Hoje, a gente consegue se entender e se respeitar. Eu aprendi a não a obrigar, a fazer coisas que eu também não gostava de fazer.”
A fisioterapeuta celebra no dia 1° de julho, os 16 anos de sua filha e a descoberta de uma nova mulher, atípica e também, uma baita corredora de rua. “Hoje corro com um grupo de pessoas que me acolhem, entendem o meu modo de ser e me apoiam. A corrida faz com que eu me sinta capaz. Me faz tão bem. Durante a vida, me falaram muitas vezes que eu era incapaz, que eu não iria conseguir ...e em 3 meses, eu consegui subir em 3 pódios. Não é meu objetivo, mas estou vendo que meu esforço e dedicação, me tornam capaz. Eu posso fazer!”
Essa também é a fala da jornalista e maratonista, Yara Achoa, que acumula 10 maratonas, pelo menos 20 meias, inúmeras provas de 5 e 10k e completa 18 anos no esporte em agosto. Mãe de Fernanda, 34 e Antonio, 22 anos, a jornalista estabeleceu um elo de parceria, amizade e companheirismo com seus filhos, que também se tornaram corredores.
Mudança de vida
“Fui mãe aos 22 anos. Me formei em dezembro e minha filha nasceu em janeiro. Na época em que todos os meus amigos estavam formados e podiam se jogar no Mundo ... Fazer mochilão, arrumar qualquer estágio ...eu já tinha uma filha!” - conta ela.
A história de Yara na maternidade, fez com que eu revisitasse diferentes situações que eu também passei, por ter sido mãe aos 18. Assim como eu, Yara precisou amadurecer muito rápido e abraçar a responsabilidade de ter um filho. Foram diversos desafios. “Hoje eu vejo como somos unidas e fortalecidas. Estamos treinando para a Meia Maratona do Rio, 3x por semana, cada uma no seu ritmo, mas juntas, e é tão legal, porque a gente começa o treino conversando um pouquinho até nos aquecermos. Se eu pudesse dar um conselho, eu diria, faça algo com seus filhos. Crie memórias!”
Portanto, a maternidade e a corrida de rua também podem se conectar. Muitas mães corredoras encontram em grupos de corrida ou comunidades online um espaço de apoio e incentivo mútuo, como foi o caso da Dani. E também conectam mães aos filhos, como no meu caso e da Yara.
Em casa, somando os filhos do meu marido, são 4 meninos e 3 deles, já estão correndo com a gente. O processo foi bem natural, sem imposição, sem obrigação, por interesse deles. E tudo indica que só mudam os “filhos” e o endereço. Yara diz que “O esporte é algo que se ensina, sem precisarmos sentar e dizer, isso é bom!” e continua: “Antonio tinha 5 ou 6 anos quando fui a uma reunião de escola. E chegando lá, uma mãe me disse que meu filho estava trazendo um problema pra ela, porque ele chegava na escola contando que a mãe tinha ganho medalha naquele final de semana. E agora, meu filho quer que eu corra também .... (risos)”
Sabemos que o papel de mães e às vezes, mães solos, ocupa uma grande parte de nosso tempo, mas como disse na Maternidade Real, não podemos sentir culpa ao cuidar de nós mesmas. A maternidade e a corrida de rua podem andar de mãos dadas, permitindo que as mães encontrem um equilíbrio entre cuidar de suas famílias e cuidar de si mesmas. É uma forma de empoderamento, autoexpressão, busca por uma vida saudável e ativa, além de uma grande inspiração para quem nos cerca.
*Este é um conteúdo independente e não reflete, necessariamente, a opinião da Orbi